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                                  O Livro que falta de Beatriz Costa                               

Pinto de Campos figurino de A Carta

Stuart

Figurino de Roiz

Amarelhe - Revista Pirilau

Pinto de Campos 1931

Amarelhe sem data

O derradeiro trabalho de Beatriz Costa continua por publicar, apesar de escrito há 22 anos. O volume de memórias não encontrou, ainda, receptividade por parte dos editores.

 

Durante meses, Beatriz Dantas, sobrinha da actriz, bateu aplicadamente à máquina o último manuscrito da tia – como havia efectuado com os manuscritos anteriores, que eram origem aos livros. Trabalho árduo, devido às constantes revisões da autora. Neste sexto volume de memórias, Beatriz Costa vai mais longe em observações a personalidades e a acontecimentos por si testemunhados. “Quero dar os nomes aos bois”, repetia-nos nos últimos meses, entusiasmadíssima com a sensação que, antevia, iria provocar. Não provocou. O original continua na gaveta, para surpresa de familiares e amigos da actriz. A linguagem frontal, o picante da escrita, a enorme frontalidade das referência têm inibido, ao que soubemos, a sua publicação.

“A minha tia estava sempre a escrever”, pormenoriza Beatriz Dantas. “Acabava um livro  e iniciava, imediatamente, o seguinte. Era muito fácil interpretar a sua letra. Revia as provas dactilografadas, mostrava-se muito exigente”.  O manuscrito em causa teve, inicialmente, os títulos de “A Vida Grande Duma Pequena Mulher”,  de seguida “ Alegrias da Vida!” e, finalmente, “Saudades do Padeiro”.

 

VIAJANTE INCANSÁVEL

Beatriz Costa foi sempre um espírito rebelde e independente, mostrou-se sempre avessa a fixar-se em sítios e a ligar-se a objectos e a casas. Daí ter escolhido  para residir, em Lisboa, o Hotel  Tivoli, onde ocupava o quarto 600 pelo qual pagava uma quantia simbólica. “A tia manteve, nos Anos 60, uma pequena quinta na Malveira, onde passava os fins-de-semana, no meio das couves, das batatas e dos animais, mas acabou por vendê-la. Mais tarde, esteve para adquirir uma moradia na Parede, mas o negócio não se concretizou. Em Lisboa, quis mudar-se para um andar de um prédio seu na Rua Rodrigues Sampaio, mas desistiu. Bom, se ela saísse do Hotel morreria por desgosto”, frisa-nos Beatriz Dantas.

A vocação de errância que caracterizava a artista levou-a a longas deslocações pelo mundo.  Viajante incansável e observadora atenta, culta e solitária, descobriu nos povos e nas terras diferentes motivos de paixão. Museus, monumentos, exposições, feiras, locais de culto, paisagens de eleição tinham nela uma admiradora incondicional. Deu várias voltas ao mundo, tendo registado nos seus livros muitas das observações, das aventuras, dos deslumbramentos então sentidos.

A vida do Hotel cortava-lhe o peso da solidão. No seu ambiente requintado, encontrava o convívio e a diversidade de contactos necessários à sua capacidade de comunicação. Beatriz Costa era uma energia a encher o vasto hall do Tivoli com as suas gargalhadas, ironias, contundências irresistíveis.

Revelou-se uma excelente investidora (vivia de rendimentos de um imóvel, após perder uma vasta carteira de acções em 1975)) e administradora.  Isso permitiu-lhe apoiar, com discrição, inúmeras instituições e pessoas, especialmente os sem-abrigo.

“ Impressionava-a muito o facto de existir gente sem um tecto”, diz-nos  Beatriz Dantas.

“A tia adorava, por outro lado, coleccionar jóias. Quando fez 88 anos comprou um magnífico anel . Não tinha receio de usar essas jóias no quotidiano.  Penso que, no fim da vida,  ofereceu essas peças a pessoas amigas”, destaca-nos a sobrinha.

 

MENINA DA FRANJA

Nos últimos anos, a actriz viu serem-lhe dedicados um auditório em Mafra  e um  museu na Malveira. Essas iniciativas tocaram-na profundamente.  A tal ponto que mandou erguer um jazigo no cemitério na Malveira – onde repousa.

O Museu Beatriz Costa guarda  colecções preciosas de fotografias, programas, objectos pessoais , artesanato, manuscritos, cartas, autógrafos. Nele sobressaem obras oferecidas por, entre outros, Miguel Torga, Jorge Amado, Vieira da Silva, Rosa Ramalho e José Franco, conjuntos de bonecas, de miniaturas de burros, de recordações trazidas de quase todo o mundo.

Popularizada como a menina da franja, mal apareceu nos palcos do Parque Mayer e nos ecrãs do cinema, Beatriz Costa depressa se impôs pelo seu talento, comunicabilidade,  alegria, inteligência e contundência. Uma sede muito grande de conhecimentos levou-a, desde logo, a tornar-se amiga de grandes vultos da nossa cultura, como Aquilino Ribeiro, Gago Coutinho, Ferreira de Castro, Miguel Torga, António Botto, Vieira da Silva, Agostinho da Silva, Mário Eloy, Stuart Carvalhais, Ricardo e Mary Espírito Santo.

Diversos pintores e escultores retrataram-na em óleos, desenhos e bustos, caso de Mário Eloy, Stuart Carvalhais, Arpad Szenes  e Martins Correia, obras de referência nas artes plásticas.

Pablo Casals (que a pediu em casamento), Greta Garbo, Marlene Dietrich, Orson Wells, Carmen Miranda foram, no estrangeiro, personalidades decisivas para Beatriz Costa.

A Jorge Amado, de quem era comadre, deveu a sua estreia nas letras, tendo-lhe ele escrito o prefácio para o primeiro livro, “Sem Papas na Língua”.  A esse trabalho, um best-seller em Portugal e no Brasil, seguiram-se “Quando os Vascos eram Santanas… e Não So”, “Mulher sem Fronteiras”, “Nos Cornos da Vida” e “Eles e Eu”.

A sua enorme capacidade de observação, a sua prodigiosa memória, a sua irresístivel graça, patentes nas obras em causa, explicam o sucesso que tiveram junto do grande público. O derradeiro livro, “Saudades do Padeiro”, um inédito, poderia ter enorme receptividade. Os sinais são aliciantes. “Devo o que tenho ao Brasil”,, escreve. ”Nele pagaram-me por dia o que aqui ganhava  num mês  Se não tenho ficado lá naquela época, durante a II Guerra Mundial, andaria hoje a assar castanhas, aqui, na Avenida da Liberdade, em vez de dormir no quentinho de um hotel”.

 

COMO ELA OS VIU

I - “Hermínia Silva foi, com Maria Teresa de Noronha, Lucília do Carmo, Carlos Ramos, Marceneiro e Max, as figuras mais autênticas do fado. Amei Hermínia como a uma irmã, durante mais de 50 anos”.

II – “O Carlos Avilez devolveu o Teatro Nacional ao público. Tivemos a impressão de que Palmira Bastos, Adelina Abranches, Amélia Rey Colaço e Lucinda Simões estavam, com ele, de volta.  Avilez não traz a reboque gente ambiciosa e parlapatona”.

III – Palmira Bastos e Mary Espírito Santo foram as duas senhoras, cada uma no seu género, que mais me ajudaram na vida. Uma na profissão, a outras nas boas maneiras”.

IV – “Gostava muito de José Malhoa. Servi-lhe de modelo várias vezes”.

V – “Quando me estreei na revista, a vedeta era a Laura Costa que só gostava de ter por moldura, colegas de palmo e meio”.

(Extractos de “Saudades do Padeiro”)

 

António Brás

S - 1

Beatriz Costa com Marlene Dietrich em 1931

S 2

Beatriz Costa com Amália Rodrigues

S-3

Beatriz Costa no livro “Carmen Miranda”

S-4

Beatriz com amigos das viagens, já preparada para publicar o 6º. Livro que ainda não viu a luz do dia.

S5

Fotografia da autoria de los Rios – 1923

S7

na Tobis

S8

Foto autografada por Beatriz Costa em 1928

S9 -

Autor desconhecido

S 10

Foto autografada ao amigo António Rodrigues – 1934

S 11

Foto Brasil – Lisboa – Recordações do Verde Gaio

S 12

Beatriz com a sua fotogenia – sem data

S 13

Beatriz Costa na Praia de Caxias – 1932

S 14

Beatriz elegante numa das suas viagens ao Brasil

S 15

Beatriz Costa fotografada por Avila – s/data

S16

Beatriz Costa fotografa oir Silva Nogueira – 1935

S 17

Beatriz Costa na Ilha da Madeira – 1934

S18

Beatriz Costa – Foto Beleza – Porto

S19

Beatriz Costa – Silva Nogueira 1928

S20

Beatriz Costa numa cena do filme Noite de Núpcias - 1931

Cronologia

1907 – Nasce a 14 de Dezembro na Charneca do Milharado, Beatriz da Conceição

1923 – Estreia-se como bailarina, com o nome de Beatriz Costa, na revista “Chá e Torradas”, no Parque Mayer

1929 – Alcança um estrondoso êxito em “Pó de Maio”. O seu talento é rapidamente reconhecido

1931 – Interpreta o papel de um rapaz de rua, atrevido e bairrista, na revista “É o Mexilhão”, que a consagra como uma grande actriz

1933 – Faz parte do elenco do filme “A Canção de Lisboa”, com António Silva e Vasco Santana

1939 – A película “Aldeia da Roupa Branca”, onde Beatriz Costa faz de lavadeira, torna a sua imagem inesquecível. Nesse ano, parte para o Brasil, fundando uma companhia teatral

1947 – Casa com Edmond Gregorian, um intelectual de origem  arménia, separando-se dois anos depois

1949 – Beatriz Costa reaparece no Parque Mayer na revista “Ela Aí Está”, obtendo um enorme êxito

1960 – Despede-se dos palcos com a revista “Está Bonita a Brincadeira”

1974 – Incentivada por Jorge Amado, escreve o primeiro livro “Sem Papas na Língua”

 1993 – Termina o derradeiro sexto livro “Saudades do Padeiro”, ainda inédito; Inauguração do Auditório Beatriz Costa, em Mafra; seguindo-se o Museu Popular Beatriz Costa, na Malveira

1994 – A Câmara de Loures atribui-lhe a Medalha de Honra

1996  – Beatriz Costa morre a 15 de Abril, no quarto 600 no Hotel Tivoli, em Lisboa

1999 -  Homenageada com o descerramento de placas na Charneca do Milharado,  aldeia onde nasceu, e na Malveira, onde se encontra sepultada

2002 – O restaurante do Hotel Tivoli é baptizado com o nome de Beatriz Costa. É lançada uma extensa fotobiografia

2007 -  O Museu Nacional do Teatro lança um Álbum de Retratos de Beatriz  Costa.

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