
Veloso Salgado I De Lisboa a Wissant
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![]() Retrato de família | ![]() Chá das 5 | ![]() Retrato de senhora |
![]() Passeio | ![]() Na praia de Leça |
Uma grande exposição, com curadoria de Maria de Aires Silveira e Elikya Kandot, diretora do Museu de Boulogne-Sur-Mer, revela-nos o universo criativo de Veloso Salgado e surpreende pela modernidade do artista.
O espólio foi legado, em 2016, ao museu pela neta do pintor, Maria da Conceição, sendo composto por cerca de 400 espécies.
O Estado recebeu um grande número de óleos, desenhos e documentação relacionado fundamentalmente com a vida e obra de Veloso Salgado.
A casa de Lisboa guardava um vasto e desconhecido acervo longamente guardado ao longo de muito tempo.
A historiadora Maria de Aires Silveira, conservadora do Museu do Chiado, estudou, inventariou e contextualizou esse acervo, provavelmente um dos maiores legados ao museu desde 1911.
Veloso Salgado nasceu, em 1864 em Orense, Espanha, mas fixou-se em Lisboa em 1874. Frequenta a Escola de Belas Artes, sendo discípulo de Ferreira Chaves e Simões de Almeida.
Com uma bolsa de estudo, o pintor frequenta a École des Beaux-Arts entre 1887 e 1891, tendo recebido aulas de Cafranel, Benjamim Constant e Delaunay.
“Em Paris, trabalhou com o mestre paisagista Jules Breton, relacionou-se com a sua filha e genro, o casal de artistas Virginie Demont-Breton/ Adrien Demont e integrou o Grupo da Escola de Wissant, no Norte de França. Conhecido retratista, na zona de Lille, Veloso Salgado convivia com estes paisagistas, e mais tarde, já em Lisboa, professor da Academia, mantinha, através de regular correspondência, uma estreita relação de amizade, ao longo da sua vida”, escreve Maria de Aires Silveira.
Parte da exposição Veloso Salgado de Lisboa a Wissant, integrou a programação da Temporada Portugal-França, apresentando cerca de 60 obras no Château Comtal – Musée de Boulogne-sur-Mer, em França. Esta será, até ao momento, uma relevante exposição, com obras do pintor, colocando-o, também pela primeira vez entre nós, em diálogo com os seus pares franceses.
Relançamento
Projectos especiais têm vindo a relançar um dos museus mais activos e personalizados de Lisboa.
Os técnicos do Museu do Chiado deram nova vida , com efeito, ao antigo edifício e às suas notáveis colecções de arte.
A ampliação das instalações vai permitir ao público apreciar a evolução das artes plásticas nacionais de 1850 aos nossos dias. Actualmente, a instituição tem um acervo de cerca de 5000 peças, destacando-se a escultura portuguesa (Canto da Maia, Francisco Franco, Jorge Vieira) e francesa (Carpeaux, Rodin, Bourdelle e Bernard), bem como trabalhos de, entre outros, Columbano, Cristino da Silva, Miguel Lupi, Veloso Salgado, Mário Eloy, Jorge Vieira, Bernardo Marques, Sá Nogueira, Marcelino Vespeira e Sousa Lopes.
Núcleos fortes
O Museu do Chiado tem um núcleo forte de pinturas, desenhos e esculturas de autores portugueses de 1850 a 1910. Do período romântico, destaca-se Cristino da Silva, Tomás da Anunciação, Francisco Metrass, José Rodrigues e Vítor Bastos. Temos de sublinhar uma rara “Marinha” e o célebre quadro “Cinco Artistas em Sintra”, de Cristino da Silva, o primeiro retrato colectivo de artistas portuguesas em plena natureza. O pintor tem uma paleta repleta de efeitos aproximando-se do romantismo internacional e anunciando o naturalismo. A sua obra é, por vezes, dramática, exprimindo a própria vivência pessoal.
Da geração seguinte, denominada pré-naturalista, sobressai Miguel Lupi com “Os pretos de Serpa Pinto”, a “Paisagem com gado”, e o “Retrato da Marquesa de Belas”, revelando-se de um realismo raro na arte nacional. O pintor foi o retratista das elites do fontismo, embora o esquema de composição seja semelhante aos retratos populares.
No chamado naturalismo destacamos a extensa obra de Silva Porto. Através das suas telas vemos uma genial transposição da natureza para a pintura, dentro de um espaço com plena liberdade e em permanente mudança.
A escultura de Soares dos Reis “O Desterrado”, gesso original, reflecte uma notável ruptura estética. A obra marca o início da pré-modernidade nas artes plásticas entre nós.
Columbano, bem representado, é um caso único, conciliando uma certa modernidade com a influência da escola holandesa e espanhola seiscentista. O “Concerto de Amadores” e o “Retrato de Antero Quental”, obras-primas do artista, são plenas de luz e sombras.
Veloso Salgado com o óleo “No Cemitério”, traz-nos imagens inesquecíveis de melancolia, ausência e sofrimento.
A escola portuense encontra-se representada por Artur Loureiro, Marques de Oliveira e Aurélia de Souza. A obra desta última, denominada “No Atelier”, mostra um intimismo, uma pintura dentro da pintura, fazendo-nos uma narrativa do seu profundo estado de alma.
Os estudos de Henrique Pousão, autor prematuramente desaparecido, traduzem um enormíssimo talento – o tratamento da paisagem revela mestria através de subtilezas e cromatismos incomuns – anunciando a modernidade.
O núcleo encerra com o óleo “Contemplação” de António Carneiro. A pincelada larga e inventiva, o efeito fugidio e rigoroso, a perfeição e a perspectiva, tornam esta obra um raro exemplo da influência impressionista entre nós.
Conservador e sombrio
Após a proclamação da República surgiu, em 1911, o Museu de Arte Contemporânea. O espólio inicial era constituído por pinturas e esculturas românticas e naturalistas provenientes das colecções do Museu de Arte Antiga. O objectivo era alargar o espaço aos artistas modernistas portugueses e estrangeiros. Alguns directores chegaram a adquirir esculturas de Rodin, Bourdelle e Bernard recusando, estranhamente, obras de Monet e Cezanne.
A instituição tornou-se, porém, por critério dos seus responsáveis, conservadora e sombria. A atitude motivou, aquando da inauguração da decoração da Brasileira, em 1925, um manifesto assinado por Almada, Bernardo Marques e Eduardo Viana. Nele exigia-se a criação de um verdadeiro Museu de Arte Moderna ou a entrada das novas correntes no velho. Apenas nos Anos 40 e 50 haveria uma abertura, com óleos de Júlio Resende, Eduardo Viana, Mário Eloy, D`Assumpção, Júlio Pomar, guaches de Vieira da Silva (faltam ainda hoje telas da artista) e Amadeo de Souza Cardoso.
Em 1959 os modernistas seriam estranhamente relegados para as reservas e substituídos pela pintura académica e oficiosa. Uma década mais tarde surge uma tentativa de integrar o museu no meio artístico português. São adquiridos quadros de Nadir Afonso, Paula Rego (uma obra excepcional), Jorge Martins, António Sena, Fernando Calhau, e esculturas de Jorge Vieira. A decadência acentuara-se, porém, irremediavelmente. A água das chuvas entrava pelos telhados, a humidade tomava conta das paredes, o espólio corria o risco de perder-se. O museu, praticamente estagnado, viria a ser encerrado em 1987.
Incêndio do Chiado
No ano seguinte, o incêndio do Chiado levou à retirada das pinturas para o Palácio da Cidadela de Cascais. As esculturas foram aos poucos transferidas para Mafra. Decidiu-se, então, repensar o destino das instalações da Rua Ivens e mesmo da própria instituição.
José Augusto França defendera anos antes que o espaço fosse apenas dedicado ao período oitocentista. O resto da colecção seria integrada na Fundação de Serralves, na época em organização. Santana Lopes, então secretário de Estado da Cultura, decidiu-se pela sua renovação. Na mesma altura decorreu uma exaustiva investigação sobre o património do museu. Parte dele encontrava-se espalhado por ministérios e embaixadas, ou havia desaparecido - como uma preciosa marinha de Silva Porto.
Inovadora fase
A abertura do rebaptizado Museu do Chiado ocorreu em 1994. O projecto foi do arquitecto francês Jean-Michel Willmotte e a sua execução custou um milhão de contos. Foi o início de uma nova fase sob a direcção de Raquel Henriques da Silva.
Até aos anos 50 existiu uma boa representação da arte portuguesa, mas a partir dai as falhas tornaram-se constantes. O museu empenhou-se, no entanto, em enriquecer e completar, nas últimas duas décadas, os seus núcleos. Já existem obras emblemáticas de António Pedro, Júlio Pomar, Fernando Lanhas, Vespeira, Joaquim Rodrigo, Sá Nogueira, Jorge Pinheiro, Lourdes Castro, Helena Almeida, José Pedro Croft e Pedro Cabrita Reis.
Da última década existem instalações de Rui Serra, Miguel Palma, João Tabarra, Ângela Ferreira e João Penalva, bem como vídeos de João Onofre e Vasco Araújo.
As dezenas de aquisições realizadas nos últimos anos tornaram-se possíveis devido ao apoio do Estado e de mecenas, sendo de destacar diversas doações, caso de desenhos de Bernardo Marques, óleos de Joaquim Rodrigo e depósitos efectuados por particulares. A ideia é o Museu do Chiado estar para Lisboa como Serralves para o Porto. "O museu faz-me lembrar um navio a navegar no alto-mar, já conheceu períodos calmos e de tempestade", afirmava-nos Jorge Vieira na inauguração da sua retrospectiva.
António Brás