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"Art Nouveau" I 30 Metamorfoses da Joalharia, 1880-1914

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De 2 de Junho a 30 de Setembro de 2023, L'ÉCOLE, School of Jewelry Arts apresenta uma nova exposição ilustrando o lugar único ocupado pela joalharia na mudança do século XIX  para o  XX, através de uma selecção de quase 100 peças de colecções museológicas, patrimoniais e privadas.

A partir da década de 1880, a estética sofreu uma transformação profunda. Um renascimento radical do imaginário, enriquecido por uma extraordinária disseminação do conhecimento científico, aumentou a potencialidade criativa em todas as esferas da arte. No final do século XIX em França, este movimento convergiu para a “Art Nouveau”, num espírito criativo que animou o trabalho dos ateliers.

Longe de ser simplesmente o reflexo de uma história de formas escritas noutros locais, a joalharia estava totalmente envolvida num fascínio pela natureza e pelos seus fenómenos. Livre de considerações práticas, sendo o único constrangimento aquele associado ao trabalho com metais e pedras, os objectos preciosos emprestaram-se admiravelmente a todo o tipo de experiências, permitindo as mais variadas combinações e as fantasias mais evocativas. Artistas como René Lalique, Georges Fouquet, Élisabeth Bonté, Victor Prouvé, Jean Dampt, Jules Desbois, Edward Colonna e Eugène Grasset tomaram então posse de uma forma de arte para a qual a principal fonte de invenção era o seu material.

Do ponto de vista técnico, caracteriza-se principalmente pela sua combinação subtil de pedras, metais e materiais de diferentes valores, com base na convicção de que a beleza de uma peça de joalharia reside no seu design artístico e não no custo dos seus componentes. Estas últimas peças, dúcteis, coloridas e cintilantes, formam silhuetas femininas, folhagem e flores, insectos e arabescos encantadores. Alfinetes, pentes, pingentes e anéis emprestam as curvas fluidas do mundo natural, numa diversidade desconcertante de temas frequentemente vistos através do prisma da fantasia onírica.

Embora, no início da década de 1910, os artistas optassem por uma estética mais inspirada na geometria, a “Art Nouveau” acabou por desenvolver um rico legado: a sua descompartimentação das artes, o contacto com as ciências e a assimilação de uma cultura visual viva acabariam por modernizar a arte da joalharia.

 

Obras-primas em três secções

A exposição na L'ÉCOLE, School of Jewelry Arts, está dividida em três secções, que permite aos visitantes explorar desenvolvimentos que se basearam tanto na utilização de materiais invulgares como na adopção de novos repertórios visuais.

1. Naturezas Mágicas

Os estilos passados não foram relegados ao esquecimento, mas o simbolismo - que surgiu pela primeira vez na década de 1880 - serviu para os reavivar. Monstros e criaturas híbridas povoavam um mundo de fantasia, como se pode ver na pregadeira da Esfinge de René Lalique e na “Serpente de Mer Ailé” (Serpente do Mar alado) de Georges Fouquet.

 

2. Natureza Mágica

Um interesse extraordinário pela botânica e pelos fenómenos de geração e pelo crescimento encorajou os artistas a associar as plantas à fluidez da seiva, representada por curvas e entrelaçamentos. Associadas ao mundo das plantas, répteis, insectos e anfíbios simbolizados por uma proliferação aparentemente desordenada e por vezes monstruosa. O interesse pelas manifestações da vida, movimento e evolução mudou a forma como o antigo tema das metamorfoses era percebido. 

Um joalheiro de referência desta época foi René Lalique. Ele contribuiu significativamente para o movimento Art Nouveau que floresceu na Europa e nos Estados Unidos entre 1895 e 1905. A sua obra caracterizou-se por motivos ornamentais, onde as linhas ondulantes e assimétricas tomavam a forma de flores, botões, galhos, asas de insectos e outros delicados elementos da natureza. Estas linhas que ora eram elegantes e graciosas, ora impunham ritmos dinâmicos, criaram uma fusão entre a estrutura e o ornamento. Esta paixão frenética da representação da natureza permitia sem dúvida mostrar estados ociosos, curvas sensuais e a palidez estética, tudo sob a forma de arabescos. A virtuosa técnica e a versatilidade de Lalique são salientadas pelo impacto da cor e do simbolismo pagão. As formas da planta e do insecto são combinados como uma parte da decoração e da função. Vários objectos diferentes foram produzidos pela energética força do seu estilo. Lalique utilizou um vocabulário delicado e luxuoso dentro da natureza artística e engenhosa Art Nouveau francesa.

As interpretações de René Lalique foram as mais livres: uma mulher emerge de um talo e estica as suas asas de libélulas; criaturas desenvolvem-se em flores. Através da sua habilidade consumada na arte do esmalte, Lucien Hirtz dá vida a uma floresta ténue: a sua luminosidade diáfana adorna uma pregadeira concebida para a Maison Boucheron. René Lalique, “Femme-Libellule” (Mulher Libélula), surge no cabo de bengala, em ouro, 1900. Musée Lalique, Wingen-sur-Mode. Lucien Hirtz, criou para a Maison Boucheron, “La Forêt” (A Floresta), um alfinete, em ouro verde e esmalte, 1910. Paris, Colecção Boucheron. 

Em última análise, o próprio processo criativo da natureza fornece inspiração. O infinitamente pequeno, que a lente de um microscópio revela como uma célula ou um cristal, apresenta uma estrutura geométrica abstracta e ordenada. Assim, a natureza já não é o oposto, mas sim a fonte de ornamento abstracto, como a cintilante madrepérola e dourada da paisagem marítima, que cobre um pente de tartaruga realizado por Georges Fouquet , (cerca de 1905).

 

3. A Figura Feminina na Natureza Ornamental

 Uma das características mais proeminentes do Art Nouveau é a utilização de figuras femininas como outra forma de decoração. A imagem romantizada de uma mulher, frequentemente nua, era um símbolo de proximidade com a natureza, com subtilezas sexuais. De certa forma, tal imagem era um aceno ao Simbolismo, um movimento artístico então popular que muitas vezes mostrava as mulheres como símbolos sexualizados de natureza descontrolada, referindo-se simultaneamente ao seu fascínio e perigo.

 

Um olhar sobre o apogeu do design de jóias

Sob a curadoria de Rossella Froissart (École Pratique des Hautes Études EPHE-PSL), a exposição propõe incorporar as jóias francesas criadas nas décadas de 1880-1914 num discurso histórico mais amplo em que as restrições de um rótulo estilístico não são impostas às obras criativas. 

Para deixar claro que a Art Nouveau é definida pela sua complexidade, cerca de uma centena de peças seleccionadas são cedidas de colecções de museus, patrimoniais e privadas.

A abordagem original da exposição responde plenamente às missões científicas empreendidas pela L'ÉCOLE, School of Jewelry Arts desde a sua criação em 2012, com o apoio da Maison Van Cleef & Arpels. Através dos seus cursos, palestras, workshops, exposições, publicações e investigação, L'ÉCOLE esforça-se por promover a arte da joalharia em todas as suas dimensões.

Excelente exposição, que nos mostra à saciedade como estes artesãos ligados à chamada “Art Nouveau” redescobriram a poesia dos objectos e a magia das cores, a reacção contra a vida ritmada pela máquina, o desejo de evasão de um passado suficientemente afastado para se cobrir de sonhos e demasiado próximo para ser esquecido e finalmente, que em Arte os verbos se conjugam numa linguagem universal.

Theresa Bêco de Lobo

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