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Georgia O'Keeffe I Primeira Retrospectiva em Paris

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“Nada é mais real do que o Realismo. É apenas através da selecção, da eliminação e da ênfase, que chegamos ao significado real dos objectos “.

Georgia O’Keeffe , 1922

Após, a última retrospectiva de Georgia O’Keeffe, no Fine Arts Museum of San Francisco, em 2000, o Centre Pompidou apresenta agora a partir de 8 de Setembro, até 6 de Dezembro de 2021, a primeira retrospectiva, em França, de Georgia O’Keeffe (1887 - 1986), uma das maiores figuras da arte norte-americana do século XX.

 

A mostra expõe cerca de uma centena de pinturas, desenhos e fotografias, oferecendo assim uma viagem completa da carreira artística da americana mais famosa da pintura. Desaparecida aos 98 anos, Georgia O’Keeffe terá passado pela maioria das aventuras estéticas do século anterior. Nos Anos 20, integrou-se no restrito círculo dos inventores do modernismo americano, depois participou, nos Anos 30, na busca pela identidade que marcou os Estados Unidos, antes de se tornar, nos Anos 60, uma pioneira da pintura abstracta.

Esta excepcional colecção de obras foi possível graças ao apoio das principais colecções internacionais privadas e públicas, principalmente norte-americanas: Georgia O'Keeffe Museum de Santa Fe, MoMA, Metropolitan Museum de Nova Iorque, Whitney Museum of American Art, Art Institute of Chicago, Thyssen-Bornemisza Museum of Madrid ...

O percurso da exposição, deliberadamente fluido e aberto, desdobra cronologicamente a trajectória artística de Georgia O'Keeffe; desde a primeira pintura "cósmica" inspirada na imensidão das planícies texanas de 1910, às metrópoles e paisagens rurais do Estado de Nova Iorque nos anos 1920/1930, ao Novo México, onde se estabeleceu definitivamente após a Segunda Guerra Mundial.

A exposição salienta a carreira artística de Georgia O’Keeffe, num espaço dedicado à Galeria 291. Quando ela se mudou para Nova Iorque, em 1918, descobriu os artistas desse espaço e movimentos inovadores da arte europeia moderna, que a inspiraram. O fotógrafo Alfred Stieglitz, co-fundador da galeria, organizou entre outras, as primeiras exposições americanas de Auguste Rodin, Henri Matisse, Francis Picabia e Paul Cézanne.

A galeria publicou o jornal Camera Work, no qual Georgia O’Keeffe descobruiu a tradução extraída de um trecho do “Spiritual in Art” (1912), de Wassily Kandinsky. A artista podia ser reconhecida na estética do pintor russo, ancorado num simbolismo que conciliava o sentimento romântico da natureza e o espiritualismo. Essa filiação reivindicada por O'Keeffe levou que a historiografia americana, com Barbara Rose e Barbara Novak em particular, a colocar o seu trabalho na posteridade da primeira pintura da paisagem americana personificada por Thomas Cole, Albert Bierstadt, Thomas Moran, assim como a vinculá-la no "transcendentalista" do filósofo Ralph Waldo Emerson e na poesia de Walt Whitman.

Alfred Stieglitz é o primeiro a exibir os desenhos de Georgia O’Keeffe na Galeria 291, em 1916/1917; surgiu desde então um amor artístico à primeira vista, depois de uma paixão, que ocorreu entre a jovem pintora e o fotógrafo que, portanto, dedicou a Georgia uma exposição anual das suas obras mais recentes.

De salientar que Georgia associava a sua pintura às "penas" mais perspicazes da crítica da sua época, contribuindo assim para o seu reconhecimento público e para consolidar o seu lugar num mercado de arte em expansão.

Em 1929, foi a primeira artista feminina a integrar os seus trabalhos nas exposições do recém-criado MoMA, e mais tarde, foi a primeira pintora, que conseguiu, que os maiores museus americanos lhe dedicassem uma retrospectiva (Chicago em 1943, o MoMA em 1946). Para a geração de artistas femininas dos Anos 60, Georgia O'Keeffe é um “quebra-gelo”, sendo ela quem abriu caminho para o reconhecimento de uma arte que não estava, necessariamente, associada ao género da sua autora.

Além das pinturas de flores pelas quais é conhecida, a exposição "Georgia O'Keeffe" no Centro Pompidou devolve à sua obra a complexidade e a riqueza iconográfica.

Dos arranha-céus de Nova Iorque e os celeiros do Lago George aos ossos de gado que ela traz dos seus passeios pelos desertos indianos (Ram’s Head, White Hollyhock-Hills, 1935), a pintura de Georgia O’Keeffe, que se reinventava ao longo das décadas. Se a inspiração nas plantas foi um motivo recorrente para a artista, a exposição insere-a numa tradição que está enraizada no grande sentimento herdado pela natureza do Romantismo histórico. Restabelecido pelo panteísmo do escritor D.H. Lawrence, ele descreve a obra de O'Keeffe e as suas paisagens e motivos naturalistas com erotismo.

A mostra evidencia o trabalho da pintora na sua fase da representação das naturezas mortas e das flores monumentais. As pinturas abrangem o período de 1908 a 1965, destacando o sentido estético, emocional e espiritual de Georgia O’Keeffe. A partir de 1915, a artista dedicou-se à pintura de paisagens e naturezas mortas.

Das composições expostas podem-se admirar as flores, folhas, ossos e carcaças de herbívoros, conchas e frutas, numa demonstração do seu sentido poético pelos elementos naturais.

O’Keeffe é considerada uma das artistas plásticas do século XX mais conceituada dos Estados Unidos.

 

Georgia O’Keeffe

Georgia de nacionalidade americana, nasceu em 1887 numa quinta em Sun Prairie, em Wisconsin. Em 1907 fixou residência em Chicago, cidade onde frequentou o “Art Institute “. Dez anos mais tarde, em 1917 mudou-se para Nova Iorque, onde conheceu o fotógrafo Alfred Stieglitz proprietário da galeria “291”, que a lançou no mundo artístico e com quem se casou em 1924.

O’Keeffe pintou Nova Iorque em todos os ângulos e com diversos materiais, interpretando de uma forma inédita, a cidade que tanto a atraía.

Georgia a partir de 1929 visitou o Sudoeste, várias vezes, para se inspirar na sua natureza e três anos após a morte de Stieglitz, em 1946, deixou definitivamente Nova Iorque para se instalar no Novo México.

O sucesso de Georgia surgiu a partir do início dos Anos 20. Já nessa época apresentava uma arte provocadora, que desafiava as normas tradicionais do espaço, da escala e da perspectiva, conceitos usados mais tarde por outros pintores.

Entre as naturezas-mortas expostas, é de referir os frutos e os vegetais, que ela própria criava no jardim da sua casa no “Lake George “, assim como as folhas que apanhava, as conchas que procurava nas praias de Maine. O’Keeffe não colocava estes elementos naturais em ambientes domésticos habituais como jardins ou cozinhas, mas sim em espaços infinitos. O uso da cor, da forma, e das texturas surgiram independentemente das influências e das lições dos pintores americanos do século XIX.

O’Keeffe ao utilizar a sua forma própria de pintar, deixando para trás todos os processos académicos, salientava o seguinte: “Pinto o que vejo – o que a flor significa para mim. Todavia vou pintá-la em grande escala e eles ficarão surpreendidos ao levarem tempo a observá-la ……”

As suas obras mostram técnicas com características bem definidas, sem hesitações, controladíssimas pelas pinceladas e pela cor. Dentro da sua visão pessoal, esta pintora realizou trabalhos de grande representação, tanto em escala como em cor, e com tratamento audacioso, quer eles representassem ossos de herbívoros, naturezas-mortas ou flores.

Nas pinturas de flores de O’Keeffe, a tela é normalmente preenchida apenas por uma ou duas flores. Elas eram pintadas num grande plano, cujo resultado é a extremidade, em que as folhas e o pedúnculo eram muitas vezes cortados. Através da sua ampliação, as flores eram retiradas do seu contexto natural e adquiriam um significado especial e tamanho extravagante. O ângulo de grande plano permitia um exame detalhado da estrutura individual do botão da flor.

As suas pinturas de flores, que sempre manteve nas suas cores naturais, são, descrições em tons simples, como indicavam os títulos que se referem a papoilas vermelhas , lírios pretos e rosas brancas.

O’Keeffe descreveu os seus sentimentos, através da cor, que considerava como o meio de expressão mais importante de toda a sua vida e dizia o seguinte: “A cor é um dos grandes objectos do mundo, que faz com que viver faça sentido para mim e , à medida que comecei a pensar na pintura , esforço-me para criar um equivalente com tinta colorida para o mundo – a vida é como a vejo .”

A graça, o encanto e a cor que Georgia transmite nas suas flores, mostram o seu grande amor pelo mundo das plantas.

A exposição evidencia também os estudos que a pintora fez sobre elementos naturais. Através destes trabalhos pode-se observar a sua rápida evolução como artista abstracta, como decompõe e sintetiza formas naturalistas, destacando unicamente os pontos essenciais para as suas composições.

As pétalas das flores tornaram-se na sua pintura ritmos ondulantes de vários tons, a pele de um fruto, um mar de luz e cor e as cavidades e as fendas das pélvis dos herbívoros oferecem uma visão de um céu azul estranho.

Estes temas são para O’Keeffe recordações de lugares e experiências, são representações da imensidade do mistério e do dinamismo da natureza. Acerca destas composições, a artista sublinhava:” usei estes elementos naturalistas para expressar o que representa para mim a extensão e a maravilha do mundo em que vivo.”

Estas pinturas com evocações poéticas e quase abstractas mostram o fascínio da pintora pelas formas puras que utilizou nas flores, nas naturezas-mortas, nas planícies do Novo México e nas ossadas dos herbívoros.

A pintura foi a vida de Georgia O’Keeffe e era como artista plástica que ela quis ser compreendida. A sua arte transmite a sua força e a atracção pela natureza, um amor que ela expressou em inúmeras flores e naturezas-mortas.

A sua pintura apresentou uma nova forma de olhar os objectos e a sua arte estava ligada intimamente à sua personalidade. A característica simples, clara e poética da sua obra está, de igual modo, reflectida na sua linguagem. Foi esta unidade com ela própria, que tornou parte do mito que a rodeou . Como o fotógrafo Ansel Adams disse três anos depois da sua morte:” A sua pintura ainda transmite uma “força” tal, que é instintiva. Ninguém consegue olhar para um quadro seu sem ficar profundamente afectado por ele. Assim essa “força” perdurará para sempre. Ela será apenas O’Keeffe , uma grande Artista.”

 

Theresa Bêco de Lobo

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