
Carlos V I Imortalizado pela obra realizada e pela pintura
![]() Os imperadores Carlos V e Isabel por Rubens | ![]() O rei por Juan Pantoja de La Cruz | ![]() Retrato equestre da autoria de Ticiano |
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![]() Barend van Orley Retrato de Carlos V | ![]() Carlos V visto por Seisenegger |
O carisma pessoal de Carlos V constitui a força impulsionadora da projecção e da sua obra. A energia do monarca, que o destacava e em quase todos os campos que desenvolveu, sensibilizou alguns dos grandes pintores e cronistas da sua época – cuja importância correspondia ao da comunicação social de hoje.
Conhecendo-se, Carlos V aproveitou como poucos esse poder que, aliás, o fascinava. Desde muito novo passou a dedicar, com efeito, grande interesse às artes plásticas e à encenação do exercício do poder político, poder que conservou de 1519 a 1555, ano em que, na Grande Sala do Tosão de Ouro de Bruxelas, abdicou do trono.
O fascínio do imperador pela pintura estendeu-se a outros rituais estéticos expressos por vários artistas, como a escultura. O entusiasmo do soberano pode ser contemplado na actualidade em dezenas de obras, da autoria de Van Orley, Seisenegger, Pantoja de La Cruz, Ticiano e Rubens,já qu estão espalhadas por colecções públicas e privadas da Europa e América.
Carlos V sentado
A primeira obra que vamos analisar, exposta na Alte Pinakothek de Munique, trata-se de um retrato do soberano encomendado a Ticiano em 1548. Na época, o artista foi convidado a deslocar-se a Angsburgo onde Carlos V pretendeu com essa encomenda celebrar a sua vitória de Muhlberg, sobre os protestantes.
Ticiano recebia importantes encomendas das cortes mais importantes da península itálica, onde nascera.
Carlos V resolveu, então, nomeá-lo “primeiro pintor da corte dos Habsburgos”.
Na pintura em questão, sobre tela, o autor define com grande pormenor o rosto do monarca, sentado ante uma paisagem em pano de fundo, quase como um fresco. A pose é natural, sem luva nem atributos imperiais. A cor revela-se típica da escola veneziana pelos contrastes entre as vestes e o chapéu negro, o vermelho do pavimento e o veludo escarlate do cadeirão de braços.
Sublinhe-se que Ticiano fixou, no seu trabalho, a figura de um homem algo envelhecido. Dessa forma conciliou, expressivamente, o perfil físico com o psicológico do retratado.
Carlos V a cavalo
O segundo retrato imortaliza Carlos V a cavalo, obra exposta no Museu do Prado, em Madrid. A tela, igualmente de Ticiano, retrata o soberano após a Batalha de Muhlberg, decisiva para a sobrevivência do império e da própria cristandade, que ocorreu em 27 de Abril de 1547. Nela os protestantes foram, como se sabe, derrotados nas margens do rio Elba. Ticiano segue a tradição clássico-romana da representação individual equestre. O rosto severo de Carlos V simboliza o poder que luta sem tréguas para proteger o catolicismo. Tons de melancolia são, paralelamente, salientados pela vasta paisagem crepuscular envolvente. O resultado revela-se de um harmonioso cromatismo que brilha sobre a sumptuosa armadura do, então, monarca mais poderoso da Europa. Este modelo virá a influenciar retratos do flamengo Van Dyck e do espanhol Velásquez.
Caçada em honra
A terceira obra em análise intitula-se a “Caçada em honra de Carlos V no Castelo de Torgan”, executada pelo pintor alemão Lucas Cranach em 1545, conservada também no Museu do Prado. A tela apresenta uma caçada aos veados organizada pelo príncipe eleitor da Saxónia no parque do Castelo de Hartenfels, perto de Torgau. Saliente-se que existem inúmeras réplicas desta composição pintadas quer por Lucas Cranach (“O Velho”), quer por seu filho Lucas (“O Jovem”). Estas encomendas devem-se ao príncipe da Saxónia que as ofereceu a outros monarcas.
Na obra em destaque, o autor traça uma composição de um mundo cavalheiresco, cortês e espectacular, onde a representação pormenorizada de nobres e animais evoca mais uma miniatura do que um quadro quinhentista.
Tosão de Ouro
Vale, por último, reter o único retrato de Carlos V existente em Portugal, guardado na coleccão dos descendentes do I Duque de Palmela. Trata-se de uma pequena tela (483 mm por 353 mm) executada em meados do século XVI por um anónimo artista flamengo. Nela o imperador enverga roupagem e adereços de cavaleiro da Ordem do Tosão de Ouro. Recorde-se que esta ordem foi fundada por Filipe “O Bom”, Duque da Borgonha, em 1429/30, quando casou com a infanta D. Isabel, para distinguir os príncipes ligados à casa-real portuguesa. Por tal motivo Carlos V, herdeiro do ducado de Borgonha, detinha essa distinção – que se tornou-se uma das mais importantes da Europa, sendo apenas concedida a dignitários de famílias reais e da alta nobreza.
Carlos V foi retratado bastante jovem e de maneira convencional, apresentando já os traços (nariz alargado, olhos finos e afastados típicos dos Habsburgos) que o caracterizariam. O resto da composição destaca a espada na mão direita e o colar de onde pende o Tosão de Ouro.
“A Glória”
Saliente-se, a terminar este trabalho, a abertura à Europa do gosto e cultura espanhóis que Carlos V promoveu.
Outro aspecto a sublinhar reside na admiração que o imperador tinha por Ticiano, que tentou convence-lo a mudar-se definitivamente para Espanha.
A sua admiração pelo artista levou Carlos V, quando retirado no Mosteiro de Yuste, após ter abdicado do trono, a mandar colocar junto do leito a tela “A Glória” de Ticiano.
Ao longo do seu reinado, Carlos V encomendou outras obras a, por exemplo, Pompeu Leoni – de quem se conserva um magnífico busto no Prado, museu que deve, aliás, parte das suas colecções a Carlos V.
António Brás